Na escola, quando aprendemos os rudimentos da escrita ficcional, é comum que os professores nos apresentem dois tipos de narradores: em primeira pessoa, que se utiliza o pronome eu, muitas vezes é um dos principais personagens da história; e em terceira pessoa, que apenas observa, conta os fatos com certo distanciamento, utiliza-se do ele ou ela com mais frequência e costuma ser mais confiável, por ser onisciente. Mas e se houvesse um narrador em segunda pessoa, que utilizasse o “tu” ou, em linguagem informal, o “você”?
Esse não é um recurso muito comum, mas existe, e sua principal função é aproximar quem lê da história, provocando, mais rapidamente, a empatia. Isso porque o narrador coloca o leitor e a leitora no lugar da personagem de quem se está falando. De repente, você encarna a personagem e é a sua vida que está sendo contada e os seus sentimentos que estão sendo explorados.
Esse é um recurso bastante comum em canções e poemas. Mais ainda na fala, quando queremos que alguém entenda melhor o que passamos, se colocando em nosso lugar. Por exemplo: imagine que Ana é professora e quer que Paulo entenda seu cansaço. Então ela começa a discursar, mais ou menos assim: “Imagine, Paulo, que você acordou 5h da manhã, arrumou suas coisas, desceu as escadas do seu prédio com pilhas de provas e cadernos nos braços, colocou tudo no carro, enfrentou um trânsito terrível, chegou na escola com a criançada já gritando, descobriu que…” e por aí vai. Esse “imagine que você” é uma forma de utilizar a segunda pessoa. Claro que não de forma poética ou literária. Afinal, aqui era penas uma conversa.
Na literatura, essa é uma forma de narrar que pode se tornar cansativa, se não for bem utilizada. Por isso, ela é não é tão comum em texto em prosa, como romances. Eu mesma não me recordo de ler nenhum livro com esse tipo de narrador, até me deparar com o novo livro de Jeferson Tenório, O Avesso da Pele (confira a resenha aqui).
Na verdade, como o autor comentou, durante a Cabine de Leitura, promovida pela Companhia das Letras e da qual eu tive a oportunidade de participar, junto com outros parceiros da editora, o seu é um falso narrador em segunda pessoa, pois esse recurso só é utilizado quando Pedro está contando a história de seu pai. Quando está narrando fatos sobre si mesmo, Pedro utiliza-se da primeira pessoa, e, ao falar da mãe, da terceira pessoa, com maior distanciamento.
Assim, ao contar a história de seu pai, o narrador nos torna seus cúmplices, nos coloca em seu lugar, provocando uma rápida identificação com a personagem e uma imersão em sua história, o quer era, de fato, o efeito desejado pelo autor.
Com a alternância entre as vozes no mesmo livro, a narrativa ficou bastante dinâmica e gostosa. Em alguns momentos, a história adquire um certo tom confessional ou se assemelha a uma conversa. Às vezes, o narrador está nos lembrando de algo que aconteceu conosco, outras vezes fala si e, outras ainda, de alguém que não está presente na conversa. E isso ficou sensacional!
E você, já leu algum livro em segunda pessoa? Tem curiosidade de ler? Conta aqui nos comentários!
Estou lendo o livro e estou gostando. Achei bem legal esse recurso do narrador.
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É um recurso bem diferentão, né? Fico feliz que você esteja gostando, Gio! Depois, vamos bater um papo sobre ele! ❤️
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